Texto e fotos: Luiz Carlos Cenci
Mais uma vitória para os produtores irrigantes do Estado. No dia 27 de março, foi votada e aprovada, no Comitê da Bacia Hidrográfica do Paranaíba, que integra o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos e é vinculado ao Conselho Nacional de Recursos Hídricos, a Deliberação nº 88/2018, que aprova as diretrizes para a regulação de usos da Bacia do Rio São Marcos a montante da Usina Hidrelétrica de Batalha (UHE Batalha).
A deliberação fornece diretrizes aos órgãos gestores para a regulação integrada dos usos dos recursos hídricos, na qual ficou decidido que para a finalidade de irrigação, será estabelecido o limite de 0,20 L/s/ha/ano, em média para a Bacia, levando em consideração a necessidade de água para cada cultura, tendo como referência os coeficientes de cultura (Kc) da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), combinando a proporção entre irrigação plena e irrigação complementar para obtenção dos limites estabelecidos.
Foi aprovado pela deliberação, o aumento linear até 2040, da vazão limite para irrigação, até o atendimento da área irrigada de 200 mil hectares no período de vigência da outorga concedida a UHE de Batalha. Além disso, também poderão ser consideradas a alternativa de reservação da água excedente da Bacia por meio de barramentos e reservatórios.
Essa discussão começou com uma resolução de 2010 da Agência Nacional de Águas (ANA), que limitou a área irrigada na Bacia do Rio São Marcos a montante da Usina de Batalha em 63 mil hectares, considerando o lado goiano, abrangido pelo município de Cristalina e o lado mineiro com o município de Paracatu, priorizando o uso da água para a geração de energia elétrica. Segundo Vitor Simão, membro titular do Comitê de Bacia do Paranaíba e responsável pela coordenação do Grupo de Trabalho São Marcos, que travou toda a discussão acerca do conflito entre os usuários da água para a irrigação e geração de energia, desde essa resolução, que limitou as outorgas para a irrigação, o Comitê vem realizando negociações, criou grupos de trabalhos e realizou estudos e levantamentos com o objetivo de reverter essa situação. Ele explicou que o setor elétrico sempre se recusou a mexer nas outorgas para a geração de energia. “Eles nunca aceitaram ceder nada. Então, o que a gente conseguiu hoje no Comitê de Bacia, é que a prioridade de outorga seja para a agricultura irrigada”, ressaltou.
Nessa primeira resolução, a ANA reduziu a potência da usina de Batalha em 5%, liberando mais água para a agricultura irrigada, além do compromisso de realizar estudos na Bacia com o objetivo de saber qual é o uso efetivo da água. “A primeira coisa que nós conseguimos é que sejam realizados estudos sobre o uso efetivo da água para irrigação. Hoje nós temos essa deliberação de prioridade de outorga, criando ambientes para discutir e atingir o máximo da área irrigada na Bacia, que seria algo em torno de 200 mil hectares, só que, para isso acontecer, além desses estudos, nós vamos precisar de obras de infraestrutura”, afirmou Simão.
Ele disse ainda que é necessário realizar negociações entre os usuários e os órgãos gestores como ANA e Secretarias de Meio Ambiente de Goiás e Minas Gerais para discutir esses limites. Simão explicou que, na atual situação da Bacia, é possível chegar a 120 mil ha de área irrigada, até 2025, sem a necessidade de intervenções ou obras. “Com o trabalho da Irrigo, sindicatos e usuários, junto com os órgãos gestores, eu acho que conseguimos, sem obras de infraestrutura, apenas com estudos, chegar a 120 mil hectares irrigados, considerando as vazões outorgadas e que, 30% dos pivôs estão parados na média, então isso já cresceria 30% da área para irrigação”, explicou.
Economia e desenvolvimento
O crescimento da área irrigada é uma necessidade para o agricultor da região, principalmente, por causa de períodos de seca que atingem as lavouras e para o aumento da produtividade, sem a necessidade de abrir novas áreas. Hoje Cristalina possui índices de produtividade nas lavouras considerados muito elevados. A região, além da safra de grãos, possui outras culturas de alto valor agregado, como os Hortifrútis (HF) por exemplo, que geram milhões de reais todos os anos em divisas para o município, além de geração de empregos e renda para centenas de famílias.
“Se a cultura irrigada mostrar força na política, mostrar musculatura econômica, ela vai conseguir se sobressair. Vai chegar um momento que vão ter que optar, ou gera energia ou produz alimentos. As vantagens socioeconômicas na produção agrícola são maiores do que na geração de energia. Nós sabemos que gerar energia é uma necessidade e também é muito importante, mas a energia pode ser gerada em muitos lugares, mas essas culturas de alto valor agregado, precisam estar aqui nessa região. É bom lembrar que essa decisão do Comitê permite a ANA abrir negociações para ampliar a área irrigada, o que antes era impossível, não significa que o irrigante vai conseguir uma nova outorga amanhã, por exemplo”, afirmou Simão.
Agricultura familiar
A agricultura familiar também será beneficiada com a liberação de mais outorgas na Bacia do Rio São Marcos. Segundo Ivan Bispo, membro titular do CBH Paranaíba e representante da Sociedade Civil, só o município de Cristalina possui mais de mil assentados na região da bacia que vão poder passar a irrigar e transformar suas propriedades. “Com a irrigação, esse pequeno produtor vai ganhar uma importância, a sua propriedade poderá se tornar rentável”, ressaltou.
Bispo afirmou porém, que isso dependerá de uma série de fatores como o comprometimento dos próprios produtores, de incentivos do governo e de financiamentos para que o pequeno possa investir em sua propriedade. “Então foram abertas essas apostas para que, principalmente os pequenos irrigantes, os pequenos agricultores, possam praticar a irrigação e produzir alimentos, principalmente os alimentos da cesta básica”, ressaltou Bispo.
Sobre o Comitê de Bacia
Os Comitês de Bacia Hidrográfica têm como finalidade promover o gerenciamento participativo e democrático dos Recursos Hídricos, visando o melhor uso possível da água. Eles são compostos por representantes da União; dos Estados e do Distrito Federal, cujos territórios se situem, ainda que em parte, em suas respectivas áreas de atuação; dos Municípios; dos usuários das águas em sua área de atuação; e das entidades civis com atuação comprovada na bacia. Os Comitês, também são conhecidos como parlamentos das águas.
Entre suas principais atribuições podemos destacar que cabe ao comitê de bacia arbitrar, em primeira instância administrativa, os conflitos relacionados a recursos hídricos, propor ao Conselho Nacional e aos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos as acumulações, derivações, captações e lançamentos de pouca expressão, para efeito de isenção da obrigatoriedade de outorga de direito de uso de recursos hídricos, de acordo com os domínios destes e estabelecer mecanismo de cobrança pelo uso de recursos hídricos e sugerir os valores a serem cobrados.