No último dia 5 de julho, a BBC News Brasil veiculou uma reportagem no canal do Youtube, de título “A crise que deixou cataratas do Iguaçu irreconhecíveis e ameaça país de falta d’água e apagão”, que retrata Cristalina, em Goiás, como um dos principais vilões na crise hídrica das Cataratas do Iguaçu, no Paraná. A reportagem aponta equivocadamente a irrigação no município de Cristalina como um dos causadores da crise hídrica.
Em vários momentos da reportagem é mencionado pelo próprio repórter que especialistas no assunto como meteorologistas, pesquisadores e geógrafo apontam a falta de chuvas como um dos motivos da crise hídrica, além do mencionado sobre a irrigação. Contudo, o foco da reportagem se dá quase que exclusivamente como o problema sendo a agricultura irrigada em Cristalina e nos demais municípios vizinhos do entorno do Distrito Federal.
Segue abaixo a íntegra da Nota de Repúdio elaborada pela IRRIGO a fim de mostrar as várias distorções dispostas no vídeo publicado no canal oficial do Youtube da BBC News Brasil.
Nota de Repúdio
NOTA OFICIAL Nº 001/2021 – IRRIGO
Assunto: Repúdio à reportagem da BBC News Brasil sobre a reportagem “A crise que deixou cataratas do Iguaçu irreconhecíveis e ameaça país de falta d’água e apagão”
A IRRIGO – Associação dos Irrigantes do Estado de Goiás, por meio desta Nota Oficial, manifesta seu repúdio em relação à reportagem exibida pela BBC News Brasil intitulada “A crise que deixou cataratas do Iguaçu irreconhecíveis e ameaça país de falta d’água e apagão”, que traz um retrato sobre a crise hídrica que ocorre no Brasil, que em seu teor tratou a irrigação, principalmente aquela praticada no município de Cristalina-GO, como a principal agente promotora de tal crise.
Entendemos que a reportagem em questão é tendenciosa e coloca uma série de distorções para seus espectadores, visto que um veículo de comunicação do porte da BBC News Brasil possui um amplo alcance midiático, no qual até o presente momento, as visualizações da reportagem já atingiram aproximadamente 175 mil visualizações e seu canal no YouTube contém 2,19 milhões de inscritos. Pelo teor dos fatos distorcidos apresentados e do seu alcance para a sociedade, consideramos que a reportagem é caluniosa ao retratar a irrigação e seus impactos ambientais.
Cabe ressaltar na presente Nota que em maio de 1978 as Cataratas do Iguaçu apresentaram volume abaixo dos 100 mil litros por segundo (o volume atual é de aproximadamente 310 mil litros por segundo), período em que o processo de irrigação no Brasil estava em seu início e boa parte dos remanescentes florestais preservados, fato este que diversos especialistas denominam como Ciclos Climáticos. Além do mais, creditar a baixa vazão dos rios da bacia hidrográfica do Rio Iguaçu à ocupação e uso das terras que ocorre na bacia hidrográfica do Rio São Marcos, não faz o menor sentido do ponto de vista geográfico, mesmo que ambos façam parte da grande bacia hidrográfica do Rio Paraná.
Afirmamos que a irrigação é a tecnologia mais avançada disponível para a produção de alimentos no Brasil e no mundo. É responsável pela produção dos principais produtos da cesta básica dos brasileiros, com destaque para a produção de arroz, feijão, batata, alho, cebola, tomate, dentre tantas outras frutas, hortaliças e cereais, o que garante a soberania e a segurança alimentar, com acesso digno aos brasileiros com base em uma dieta rica e de baixo custo.
A irrigação é um dos principais vetores de preservação florestal, pois a utilização dessa tecnologia permite otimizar a ocupação e o uso das terras, com a garantia de produzir em um mesmo local o que seria necessário em uma área 3 vezes maior, portanto, é possível afirmar que para 1 hectare irrigado, outros 3 hectares são preservados. A irrigação traz segurança para a produção, pois consegue suprir a necessidade hídrica das plantas em momentos de estiagem, de tal forma que as áreas irrigadas são capazes de produzir, no mínimo, 6 vezes mais do que as áreas que não irrigam.
No que se refere à preservação florestal, é importante frisar que o desmatamento é uma prática legal, prevista pelo Código Florestal Brasileiro (Lei nº 12.651 de 25 de maio de 2012), bem como o Brasil é o país com as maiores reservas florestais do mundo e sua maior parte se encontra em áreas particulares e propriedades rurais. Não obstante, incentivamos a redução de desmatamento e acreditamos que em um futuro próximo podemos alcançar o Desmatamento Zero, também reconhecemos que o desmatamento ilegal é uma prática que deve ser punida com os maiores rigores da lei.
É importante frisar que a irrigação não consome água, diferente de outros usos, parte da água utilizada na produção agropecuária é metabolizada pelas plantas e se transforma em alimentos, uma outra parte evapora pelo ciclo da água, enquanto o excedente deve infiltrar para o solo e contribuir para segurança hídrica dos mananciais. O ponto que precisa de atenção quanto ao uso da irrigação é o escorrimento superficial, que pode provocar impactos ambientais, como processos erosivos. No entanto, o Brasil é exemplo mundial na conservação do solo, com o desenvolvimento de sistemas como o Plantio Direto, entre outras técnicas conservacionistas.
Todos os produtores rurais irrigantes sabem da importância da água para a manutenção de suas atividades e o custo desse importante recurso natural. Existe muita sensatez e responsabilidade, de forma que não cabe desperdício em seu uso, uma vez que o custo da energia que incide sobre os equipamentos de irrigação, independente do seu porte ou finalidade, é bastante elevado, além da cobrança pelo uso da água nas bacias hidrográficas que já implementaram esse mecanismo de gestão.
Outra questão importante que precisa ser esclarecida em relação à crise hídrica instituída na Bacia Hidrográfica do Rio São Marcos, foi a instalação da UHE Batalha, que prejudicou todo o desenvolvimento socioeconômico do município de Cristalina em Goiás, dos municípios de Paracatu e Unaí em Minas Gerais e de parte do Distrito Federal, região com forte vocação para a produção agropecuária, incluída no atlas de Irrigação da ANA (Agência Nacional de Águas), como uma das principais áreas de expansão da agropecuária irrigada no país. O CBH Paranaíba já instituiu que o uso prioritário para essa região da bacia hidrográfica é para a produção agropecuária e um Marco Regulatório foi elaborado. No entanto, o setor hidrelétrico reiteradamente busca desmoralizar as ações legítimas do CBH Paranaíba e potencializa o segundo maior conflito pelo uso da água no país.
O Brasil é um país de grande extensão territorial e com forte aptidão para o desenvolvimento de outras matrizes de geração de energia, como eólica, solar e biomassa. Portanto, não se justifica afirmar que a irrigação é responsável pelo baixo volume dos reservatórios das hidrelétricas, tão pouco pelo comprometimento do abastecimento de água nos municípios, quando a Lei da Águas (9.433 de 8 de janeiro de 1997) institui o uso múltiplo de água para os diferentes setores e, em momentos de escassez, a prioridade é para o abastecimento humano e dessedentação animal. Contudo, a afirmação que a geração hidrelétrica é limpa tem suas contradições, uma vez que a construção de barragens do porte necessário para Usinas Hidrelétricas (UHE) provocam alterações na fisiografia da paisagem, danificam de forma irreversível a ecologia local, alteram a condição hídrica ao transformar ambientes lóticos em lênticos e modificam o clima local, além do mais as UHE geralmente são instaladas em rios de grande porte, o que potencializa todos os danos ambientais mencionados anteriormente em uma maior escala espacial.
Diante do que foi apresentado, a IRRIGO solicita que a BBC News Brasil reconheça publicamente que errou ao publicar a reportagem sem buscar maiores esclarecimentos de outras partes, o que ocasionou um grande desconforto ao setor da produção agropecuária em nível nacional, mas que impactou diretamente o Estado de Goiás ao retratar, de forma distorcida e tendenciosa, a situação do município de Cristalina, pois houve um dano à imagem da produção agropecuária irrigada em nível nacional, visto o alcance da BBC News Brasil, um dos mais importantes veículos de comunicação do Brasil e do mundo.
Certos de que as questões foram esclarecidas, da ética e responsabilidade que envolve a imprensa independente nacional, a IRRIGO se coloca à disposição para auxiliar no que for necessário.
Cristalina, 08 de junho de 2021
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Luiz Carlos Figueiredo
Presidente
IRRIGO – Associação dos Irrigantes do Estado de Goiás