Cálculos do Grupo de Inteligência Territorial Estratégica (Gite) da Embrapa, a partir das análises de dados geocodificados do Cadastro Ambiental Rural (CAR), mostram significativa participação da agricultura na preservação do meio ambiente. Resultados preliminares apontam que, no final de 2016, mais de 170 milhões de hectares de vegetação nativa estavam preservados pelos agricultores dentro dos imóveis rurais, o que representa mais de 20% do território brasileiro.
Os trabalhos, coordenados pelo pesquisador Evaristo de Miranda, chefe-geral da Embrapa Monitoramento por Satélite (SP), foram iniciados com a incorporação da base de dados do CAR do Serviço Florestal Brasileiro ao Sistema de Inteligência Territorial Estratégica (Site) do Gite. As informações disponibilizadas contêm dados como o perímetro do imóvel rural, além de mapas das áreas exploradas, consolidadas, de preservação permanente, de reserva legal, de interesse social, de utilidade pública entre outros. Ao todo, quase 4 milhões de imóveis rurais estavam inscritos no CAR até dezembro de 2016, abrangendo uma área cadastrada da ordem de 400 milhões de hectares. Como o cadastramento ainda está aberto, esses números não param de crescer.
Miranda deu uma dimensão do trabalho empreendido pela equipe do Gite. Segundo o pesquisador, os dados dos 4 milhões de imóveis cadastrados – repartidos em 5.570 municípios – resultaram em um arquivo de mais de 40 Gigabytes compactados e de estrutura bastante complexa. Centenas de milhões de polígonos foram analisados por procedimentos de geoprocessamento pela equipe do Gite, que totalizou as áreas de preservação permanente e as reservas legais dentro de cada imóvel e retirou as sobreposições e incongruências. “São 18 categorias de uso e ocupação das terras geocodificadas em cada imóvel rural. E, para cada categoria, há, em geral, mais de um polígono por imóvel”, ressaltou.
Para o pesquisador, o enorme e complexo conjunto de dados geocodificados – big data – colocou desafios inéditos para a equipe do Gite. “Dados dessa natureza nunca estiveram disponíveis, tampouco existiam métodos e procedimentos de tratamento de informação validados a serem aplicados neste caso. Tivemos que desenvolver, testar, validar e aplicar um procedimento inédito de tratamento de dados, apoiado em técnicas de geoprocessamento e tecnologias da informação”. Nesse sentido, ainda de acordo com Miranda, um dos principais resultados obtidos foram os métodos desenvolvidos e validados. Um tutorial será disponibilizado no site do projeto para uso de outros técnicos e pesquisadores.
Após as análises dos milhões de polígonos dos imóveis cadastrados, o resultado surpreendeu a equipe do Gite. “O que mais nos impressionou foi a quantidade de vegetação nativa preservada. As áreas totalizadas equivalem a mais de 170 milhões de hectares de vegetação nativa preservada dentro dos imóveis, pelos agricultores. Isso representa mais de 20% do território brasileiro, enquanto todas as Unidades de Conservação (UCs) totalizam 13% do Brasil”, comparou Miranda. E esses números, segundo a equipe que fez a análise, ainda deverão aumentar, pois não incorporaram os dados dos imóveis rurais do Espírito Santo e do Mato Grosso do Sul, que até o momento não se integraram ao CAR nacional, por exemplo.
Esse panorama é o mesmo em todas as regiões do Brasil. “Quando consideramos os imóveis em seu conjunto, os produtores rurais preservam em vegetação nativa uma parcela dos imóveis sempre superior à exigida pelo Código Florestal, que é de no mínimo 20%”, disse.
As análises dos dados do CAR serão atualizadas pela Embrapa semestralmente. Para Evaristo de Miranda, os dados devem sofrer mudanças. “Os agricultores ainda estão se cadastrando e os números terão pequenas alterações até o final deste ano, quando termina o prazo do cadastramento. A quantidade de áreas preservadas nos imóveis rurais certamente vai aumentar.”
Todos os métodos empregados, tanto em geoprocessamento como nos procedimentos estatístico-matemáticos, bem como os resultados numéricos e cartográficos obtidos para cada microrregião, estado, região e País, estão disponíveis aqui.
Levantamento por Região
Análises do Gite mostram que, no Sul, UCs e terras indígenas protegem 2% da região, enquanto produtores preservam o equivalente a 17% da área da região. Dentro da área agrícola, por sua vez, os agricultores preservam 26% das terras, número superior à exigência do Código Florestal (definida em 20%).
No Sudeste, apontam os cálculos, os produtores preservam 17% da vegetação nativa, enquanto o Estado protege 4%. Na área rural, eles preservam 29% de suas terras, número também superior à exigência da legislação ambiental. As análises não contam ainda com os dados do Espírito Santo.
De acordo com as análises do Gite, na região Centro Oeste − ainda sem os dados do Mato Grosso do Sul − os produtores preservam em seus imóveis 33% da região, ao passo que áreas protegidas preservam 14%. Na área agrícola, 49% das terras são mantidas em vegetação nativa.
Chamam atenção os números do CAR na região Norte. No Tocantins, por exemplo, o estudo aponta que a agricultura preserva o dobro da área total das unidades de conservação e terras indígenas: 20% contra 10%. Nos imóveis, os produtores apresentam uma taxa de preservação da vegetação nativa de 56%. “Esse é o único estado da região não inserido integralmente no bioma Amazônia”, ressaltou Evaristo. Nos estados amazônicos, ele explicou, a proteção ambiental é abrangente: 71% do Amapá, 53% do Amazonas e 50% do Pará, além de amplos territórios recobertos por floresta tropical em terras devolutas.
Até o momento, o Nordeste conta com poucas áreas cadastradas no CAR − 34% do total. Os dados analisados, contudo, acompanham a mesma tendência das demais regiões e revelam o papel dos agricultores na preservação da vegetação nativa. De acordo com os cálculos do Gite, na maioria dos estados nordestinos, os produtores preservam mais de 50% da área de seus imóveis. A área preservada pela parcela de agricultores cadastrados no CAR, até 2016, já representava cerca de 20% da região, enquanto as áreas protegidas conservavam menos de 10%.
Na opinião de Miranda, as análises desenvolvidas com os dados do CAR colocam em questão a “vilanização” da agricultura na temática ambiental. “Ocorreram situações problemáticas e irregulares que chamaram a atenção da sociedade. Mas elas não são a regra. A grande maioria dos agricultores não pode ser tachada de devastadores da natureza. Os dados demonstram que ninguém preserva mais o meio ambiente no Brasil que o agricultor”, afirmou.
Fonte: Embrapa Monitoramento por Satélite
Texto: Alan R. dos Santo